quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A história da Lua

É de noite.
 
Pequenos pirilampos luminosos esvoaçam ao longo da cidade deixando um rasto de ruído silencioso pela estrada, iluminada por pequenas estrelas de tons de fogo (aquelas estrelas às quais os humanos chamam candeeiros, mas prefiro chamar-lhes estrelas). Os cães ladram na rua, lutando cada matilha pelo seu território, perturbando a vizinhança que tenta "pregar olho". O Sol nocturno vai alto, recortado, em forma de círculo cinza. E eu olho, só, à janela, todo este panorama sossegadamente irrequieto, desta noite, igual a tantas outras que já vi passar pela janela. Olho para lá para fora, para láá para fooora. De repente, a minha mente é invadida por pensamentos acerca do que estará láá fora, do que é ser láá fora! Com um leve ronronar e umas cabeçadas ternurentas nas pernas do Artur, consigo que ele me abra a janela e me deixe ir lá para fora, para mais perto dos pirilampos e das estrelas de rua. Sinto uma lufada de ar parecida com a que sinto quando abro aquela coisa gigante e branca, onde consigo sentir o cheiro a bacon e a alguns restos de peixe. Equilibro-me no parapeito da janela e observo o Sol da noite na esperança que ele me aqueça, mas não acontece nada... deve ser por causa de o Sol ter desligado a luz para poupar energia, o Artur também faz isso. Procuro uma forma de chegar ao telhado,  sem chamar a atenção dos cães, distraídos com as suas pequenas lutas territoriais. Uma pata aqui, outra à frente, um pequeno impulso, upaaa, termino o salto em cima das telhas, que me deixam quase escorregar. Cá de cima consigo ver os pirilampos e as estrelas todas (aquelas que estão espalhadas pela cidade às quais o Artur chama candeeiros, não sei bem porquê). Olho o céu e vejo duas luzes que piscam e mudam de lugar. Às vezes vejo-as a passar, e quando o meu dono está por perto, diz-me sempre "Olha, olha, tás a ver? É um avião!", mas eu acho um nome muito ridículo para duas luzinhas que se mexem no céu até se perderem por detrás das nuvens, portanto chamo-lhes simplesmente "luzinhas".
O Artur chama-me para dentro - está na hora em que as pessoas vão para aquelas almofadas enormes, fecham os olhos e fazem um barulho horroroso, uma espécie de rosnar, pela boca e pelo nariz. Finjo não o ouvir e volto devagar. Quando chego perto da janela, o quentinho e o conforto do lar seduzem-me para voltar para dentro, para o colo do meu dono, que me recebe. A janela fecha-se, o sol da noite descansa, os pirilampos são cada vez menos e as estrelas continuam no seu trabalho sério e nocturno. E eu, em cima da grande almofada onde as pessoas fecham os olhos, enrosco-me de forma a sentir a fofura do tecido daquilo a que elas chamam "edredom". A luz desliga-se e o meu dono deseja-me boa noite, eu mio em retorno. E os meus pequenos olhos sonham com pirilampos que correm pelas ruas, e estrelas chamadas candeeiros e um sol que fica de tons cinza à noite para poupar energia. E isto e tudo mais que posso ver do meu telhado, numa noite como outra qualquer, mas diferente de todas as outras.

1 comentário:

  1. o 'artur' é de facto um gatooo (a)
    "...numa noite como outra qualquer, mas diferente de todas as outras.", adoro *.*

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